E a música de hoje é...
(14 de Junho de 1944, nasce o músico, cantor e compositor brasileiro Chico Buarque)
CHICO BUARQUE - «Valsinha»
Poet'anarquista
VALSINHA
Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre
chegar
Olhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto, convidou-a pra rodar
Olhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto, convidou-a pra rodar
E então ela se fez bonita como há muito tempo não queria
ousar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça, foram para a praça e começaram a se abraçar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça, foram para a praça e começaram a se abraçar
E ali dançaram tanta dança que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade que toda cidade se iluminou
E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu, e o dia amanheceu em paz
E foi tanta felicidade que toda cidade se iluminou
E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu, e o dia amanheceu em paz
Chico Buarque
Foi na noite da valsinha. Logo a seguir ao golpe dos coronéis. Ainda os anos sessenta espalhavam fulgores. Os generais e coronéis já tinham enchido as cadeias, proibido as letras e preparavam-se para proibir tudo resto. Pelo início da noite, a mulata descia a Calçada da Baiana, pedras ainda alinhadas à português colonial, desrespeitando moralidades, éticas e bons costumes, com o não-comprimento da mini-saia rodada, exibindo o moreno das coxas. Umbigo espreitando na seteira horizontal e alcinha fina, descobrindo aqueles ombros todinhos feitos de ouro velho. Vinha descalça, com os pés assentando por inteiro no empedrado. Trazia o cabelo enfeitado com uma flor branca. E foi assim que chegou à Praça do Pelourinho. Era esperada por Gabriela, por Tieta, por Dona Flor (agora sem maridos), por Teresa Baptista (cansada de guerra) e pela negra Doroteia, todas, todinhas, personagens malandras de Jorge Amado. E foi esta última, a negra Doroteia, quem explicou a situação: «Hoje, Yemanjá está em terra, meninas!»
ResponderEliminarDigno de ser visto, digo-lhes eu, que não acredito em fantasias.
Seu Chico já a esperava de braços abertos. Foi então que tocaram a valsinha.
"E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouvia mais que o mundo compreendeu, e o dia amanheceu em paz"
Naquela Baía de Todos os Santos
O. W. Calabrese