«A Voz do Mar»
Conto de Alves Redol
148- «A VOZ DO MAR»
O Artur sentiu sobre a orelha uma coisa muito fria, com um
som...
- O que é, mãe?
- Não ouves?
Sim, ouvia. Era um som pesado lá ao longe e que depois vinha, vinha e subia, e
que depois se tornava mais brandinho, para logo voltar a vir de longe. Parecia
música, mas não era bem música. E talvez fosse. Bom, não seria bem música.
- O que é, mãe? - voltou a perguntar. - Que barulho é este?
- É o mar... É a voz do mar...
- A voz do mar?!
- O mar fica longe, mas a voz meteu-se aí dentro. Isto é um búzio.
- E onde nascem os búzios?
- No mar.
- Então é por isso que se ouve...
- Pois é. As ondas fazem um barulho assim quando se ouvem ao longe. E a gente
está longe. Não ouves a voz que lá vem?
- Oiço.
- E depois quebra-se assim como as ondas na areia.
- Então isto é o mar? O mar é o oceano. No mapa chamam-lhe oceano. Parece que
há vários... . Eu já ouvi aos que andam no quarto ano: é o Oceano Atlântico, o
Oceano Índico...
- Não achas que mar é mais bonito?
- Pois é, mar é muito mais bonito.
De repente, fechou os olhos e juntou as duas mãos sobre o búzio, apertando-o
contra o ouvido.
- Agora deve ser um navio que lá vem. É mesmo, é, é um navio...
A mãe aproximou o ouvido, desviando o lenço.
- Não ouves?
Não, a mãe não ouvia. Mas o importante para ele era ter o mar apertado entre as
mãos.
Lá vinha uma onda... e outra.
Alves Redol
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