quinta-feira, 15 de maio de 2014

OUTROS CONTOS

«A Voz do Mar», por Alves Redol.

«A Voz do Mar»
Conto de Alves Redol

148- «A VOZ DO MAR»

O Artur sentiu sobre a orelha uma coisa muito fria, com um som...

- O que é, mãe?

- Não ouves?

Sim, ouvia. Era um som pesado lá ao longe e que depois vinha, vinha e subia, e que depois se tornava mais brandinho, para logo voltar a vir de longe. Parecia música, mas não era bem música. E talvez fosse. Bom, não seria bem música.

- O que é, mãe? - voltou a perguntar. - Que barulho é este?

- É o mar... É a voz do mar...

- A voz do mar?!

- O mar fica longe, mas a voz meteu-se aí dentro. Isto é um búzio.

- E onde nascem os búzios?

- No mar.

- Então é por isso que se ouve...

- Pois é. As ondas fazem um barulho assim quando se ouvem ao longe. E a gente está longe. Não ouves a voz que lá vem?

- Oiço.

- E depois quebra-se assim como as ondas na areia.

- Então isto é o mar? O mar é o oceano. No mapa chamam-lhe oceano. Parece que há vários... . Eu já ouvi aos que andam no quarto ano: é o Oceano Atlântico, o Oceano Índico...

- Não achas que mar é mais bonito?

- Pois é, mar é muito mais bonito.

De repente, fechou os olhos e juntou as duas mãos sobre o búzio, apertando-o contra o ouvido.

- Agora deve ser um navio que lá vem. É mesmo, é, é um navio...

A mãe aproximou o ouvido, desviando o lenço.

- Não ouves?

Não, a mãe não ouvia. Mas o importante para ele era ter o mar apertado entre as mãos. 

Lá vinha uma onda... e outra.

Alves Redol

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