«O Pecado»
Conto de Olavo Bilac
191- «O PECADO»
A Anacleta ia caminho da igreja, muito atrapalhada, pensando
no modo porque havia de dizer ao confessor os seus pecados... Teria a coragem
de tudo? E a pobre Anacleta tremia só com a ideia de contar a menor daquelas
cousas ao severo padre Roxo, um padre terrível, cujo olhar de coruja punha um
frio na alma da gente. E a desventurada ia quase chorando de desespero, quando,
já perto da igreja, encontrou a comadre Rita.
Abraços, beijos... E lá ficam as duas, no meio da praça, ao
sol, conversando.
— Venho da igreja, comadre Anacleta, venho da igreja... Lá
me confessei com o padre Roxo, que é um santo homem...
— Ai! comadre! — gemeu a Anacleta — também para lá vou... e
se soubesse com que medo! Nem sei se terei a ousadia de dizer os meus
pecados... Aquele padre é tão rigoroso...
— Histórias, comadre, histórias! — exclamou a Rita — vá com
confiança e verá que o padre Roxo não é tão mal como se diz...
— Mas é que meus pecados são grandes...
— E os meus então, filha? Olhe: disse-os todos e o Sr. padre
Roxo me ouviu com toda a indulgência...
— Comadre Rita, todo o meu medo é da penitência que ele me
há de impor, comadre Rita...
— Qual penitência, comadre?! — diz a outra, rindo — as
penitências que ele impõe são tão brandas!... Quer saber? contei-lhe que ontem
o José Ferrador me deu um beijo na boca... um grande pecado, não é verdade?
Pois sabe a penitência que o padre Roxo me deu?... mandou-me ficar com a boca
de molho na pia de água benta durante cinco minutos...
— Ai! que estou perdida, senhora comadre, ai! que estou
perdida! — desata a gritar a Anacleta, rompendo num pranto convulsivo — Ai! que
estou perdida!
A comadre Rita, espantada, tenta em vão sossegar a outra:
— Vamos, comadre! que tem? então que é isso? sossegue! tenha
modos! que é isso que tem?
E a Anacleta, chorando sempre:
— Ai, comadre! é que, se ele me dá a mesma penitência que
deu á senhora,
— não sei o que hei de fazer!
— Porque, filha? porque?
— Porque... porque... afinal de contas... eu não sei como é
que... hei de tomar um banho de assento na pia!...
Olavo Bilac
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