17 de Outubro de 1944, morre o poeta português Eugénio de
Castro, introdutor do Simbolismo, autor de «Cristalizações da Morte» e «Canções
de Abril».
Poet'anarquista
Por aqui- «SOMBRA
E CLARÃO», POR EUGÉNIO DE CASTRO
«Um Sonho»
Sonhos, pintura de Cristiane Campos
UM SONHO
Na messe, que enlourece, estremece a quermesse...
O sol, celestial girassol, esmorece...
E as cantilenas de serenos sons amenos
Fogem fluídas, fluindo a fina flor dos fenos...
As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros...
Cornamusas e crótalos,
Cítolas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em Suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves
Suaves...
Flor! enquanto na messe estremece a quermesse
E o sol, o celestial girassol, esmorece,
Deixemos estes sons tão serenos e amenos,
Fujamos, Flor! à flor destes floridos fenos...
Soam vesperais as Vésperas...
Uns com brilhos de alabastros,
Outros louros como nêsperas,
No céu pardo ardem os astros...
Como aqui se está bem! Além freme a quermesse...
- Não sentes um gemer dolente que esmorece?
São os amantes delirantes que em amenos
Beijos se beijam, Flor! à flor dos frescos fenos...
As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros...
Cornamusas e crótalos,
Cítolas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em Suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves...
Esmaece na messe o rumor da quermesse...
- Não ouves este ai que esmaece e esmorece?
É um noivo a quem fugiu a Flor de olhos amenos,
E chora a sua morta, absorto, à flor dos fenos...
Soam vesperais as Vésperas...
Uns com brilhos de alabastros,
Outros louros como nêsperas,
No céu pardo ardem os astros...
Penumbra de veludo . Esmorece a quermesse...
Sob o meu braço lasso o meu Lírio esmorece...
Beijo-lhe os boreais belos lábios amenos,
Beijo que freme e foge à flor dos flóreos fenos...
As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros...
Cornamusas e crótalos ,
Cítolas, cítaras, sistros ,
Soam suaves , sonolentos ,
Sonolentos e suaves ,
Em Suaves ,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves...
Teus lábios de cinábrio, entreabre-os! Da quermesse
O rumor amolece, esmaece, esmorece...
Dê-me que eu beije os teus morenos e amenos
Peitos! Rolemos, Flor! à flor dos flóreos fenos...
Soam vesperais as Vésperas...
Uns com brilhos de alabastros,
Outros louros como nêsperas,
No céu pardo ardem os astros...
Ah! não resista mais a meus ais! Da quermesse
O atroador clangor, o rumor esmorece...
Rolemos, ó morena! em contactos amenos!
- Vibram três tiros à florida flor dos fenos...
As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros...
Cornamusas e crótalos,
Cítolas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em Suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves...
Três da manhã. Desperto incerto...E essa quermesse?
E a Flor que sonho? e o sonho? Ah! tudo isso esmorece!
No meu quarto uma luz, luz com lumes amenos,
Chora o vento lá fora, à flor dos flóreos fenos...
Eugénio de Castro
(Arcachon,12 de Julho de 1889)
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