«Graus Negativos»
Conto Poético de Tomas Transtrômer
458- «GRAUS NEGATIVOS»
Encontramo-nos numa festa que não gosta de nós. Ao fim, a festa deixa cair a
sua máscara e mostra-se tal como é: uma estação de manobras. Colossos gelados
estão de pé, sobre os carris, no nevoeiro. Um pedaço de giz riscou as portas da
carruagem.
Não se devia mencionar, mas aqui há muita violência reprimida. Por isso os
pormenores são tão pesados. E é tão difícil vermos o outro, que também existe:
um raio de sol reflectido que se movimenta por cima do muro da casa, que
desliza através do bosque ignorado, de rostos cintilantes; uma frase bíblica
que nunca se escreveu: «vem até mim, pois eu sou contraditório como tu».
Amanhã trabalharei numa outra cidade. Eu corro para lá, através da madrugada
que é um grande cilindro negro e azul. Oríon está pendurada por cima da geada.
Crianças num montão de mudez esperam pelo autocarro, crianças pelas quais
ninguém reza. A luz cresce, pouco a pouco, como o nosso cabelo.
Tomas Transtrômer
Sem comentários:
Enviar um comentário