«De Amor e de Sombra»
Romance de Isabel Allende
579- «DE AMOR E DE SOMBRA»
[Excerto]
“Até então ele havia procurado mantê-la alheia às misérias
irreparáveis, à injustiça e à repressão que diariamente presenciava e eram
temas de conversa habituais entre os Leal.
Considerava extraordinário que Irene navegasse inocente
nesse mar de escolhos que afogava o país, ocupada somente com o pitoresco e o
anedótico. Surpreendia-se ao vê-la pairando, sem se poluir no ar de suas boas
intenções.
Esse injustificado optimismo, essa limpa e fresca vitalidade
de sua amiga revelavam-se balsâmicos para os tormentos que ele padecia por não
poder mudar as coisas.
Nesse dia, entretanto, teve a tentação de pegá-la pelos
ombros e sacudi-la até pôr seus pés na terra e lhe abrir os olhos para a
verdade.
Mas ao contemplá-la junto ao muro de pedra de sua casa, com
os braços carregados de flores silvestres para seus velhos e o cabelo revolto
pela viagem na moto, intuiu que essa criatura não fora feita para as realidades
sórdidas.
Beijou-a na face o mais próximo possível da boca, desejando
com paixão permanecer ao seu lado eternamente para protegê-la das sombras.
Cheirava a ervas e tinha a pele fria. Soube que amá-la era
seu destino inexorável”
Isabel Allende
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