«Um Anarquista e Outros Contos»
Romancista Inglês, de origem Polaca
704- «UM ANARQUISTA E OUTROS CONTOS»
[Excertos]
“Anarquistas, suponho, não têm famílias –de qualquer forma,
não do modo como entendemos essa relação social. A organização em famílias
talvez responda a uma necessidade da natureza humana, mas em última instância é
baseada na lei, e portanto deve ser algo odioso e impossível para um
anarquista. Mas, de fato, não entendo os anarquistas. Um homem dessa… dessa
facção permanece anarquista quando só, totalmente só e indo dormir, por
exemplo? Ele deita sua cabeça no travesseiro, puxa suas mantas e vai dormir com
a necessidade do ´chambardement général´, como na gíria francesa, o ´bombardeio
geral´, sempre presente em sua mente? Se sim, como pode? Estou certo de que se
tal fé (ou fanatismo) se apossasse de meus pensamentos, jamais seria capaz de
compor-me suficientemente para dormir ou comer ou realizar quaisquer das
rotinas da vida diária. Não desejaria esposa, ou filhos; não poderia ter
amigos, me parece… Enfim, não sei. Tudo o que sei é que o Sr. X fazia suas
refeições num restaurante muito bom, que eu também frequentava.”
“A parte mais
interessante era o seu diário; pois esse homem, metido num trabalho tão
mortal, teve a fraqueza de manter um registo do tipo mais condenatório. Lá
estavam seus actos e pensamentos, desnudados diante de nós. Mas os mortos não se
importam com isso… Um humanitarismo vago mas ardente o havia impelido em tenra
idade para os mais amargos extremos da negação e da revolta. Você já ouviu
falar de ateus convertidos. Eles se tornam fanáticos perigosos, mas a alma permanece
a mesma. Após ter conhecido a garota, encontram-se naquele seu diário estranhas
rapsódias político-amorosas. Tomava as poses de soberania dela com seriedade
circunspecta. Ansiava por convertê-la… não sei se você se lembra, faz uns bons
anos já, da sensação jornalística do Mistério da Hermione Street; encontraram o
corpo de um homem no porão de uma casa vazia; o inquérito, algumas
prisões, várias conjecturas, e então silêncio, o final costumeiro para muitos
mártires e confidentes obscuros. O fato é que ele não era suficientemente
optimista. É preciso ser um optimista selvagem, tirânico, impiedoso, um faz-tudo
como Horne, por exemplo, para resultar num bom rebelde social do tipo
extremista”. O narrador pergunta sobre a garota: “Você quer realmente
saber? Confesso a pequena malícia de ter-lhe enviado o diário de Sevrin.
Ela retirou-se; foi, então, para Florença; daí, recolheu-se a um convento. Não
lhe saberia dizer onde irá depois. E isso importa? Gestos! Gestos! Meros gestos
de sua classe! … Por isso essa raça está com os dias contados”.
Joseph Conrad
Sem comentários:
Enviar um comentário