«Crimes Exemplares»
Estátua em Paris de René Descartes
795- «CRIMES EXEMPLARES»
Penso, logo existo, disse o tal homem famoso.
As árvores do meu jardim existem, mas não creio que pensem,
pelo que fica demonstrado que o senhor René não estava bom do juízo e que o
mesmo acontece com outros seres: o meu sogro, por exemplo – existe, mas não
pensa. Ou o meu editor, que pensa, mas não existe. E se pomos isto ao
contrário, também não fica certo. Não existo porque penso ou penso porque
existo. Pensar, pensa-se, existir é um mito.
Eu não existo, sobrevivo, porque viver – aquilo a que se
chama viver – só os que não pensam. Os que se metem a pensar, não vivem. A
injustiça é por demais evidente.
Bastaria que pensássemos para nos suicidarmos.
Não; senhor Descartes: vivo, logo não penso, se pensasse não
vivia, se vivesse não pensava, senhor… etc., etc. Se para viver fosse
necessário pensar, estaríamos lúcidos.
Mas, enfim, se os senhores estão convencidos de que assim é,
estou inocente, completamente inocente, pois não penso nem quero pensar. Logo,
se não penso não existo e, se não existo, como diabo posso ser responsável por
essa morte?
Max Aub
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