sábado, 11 de junho de 2016

OUTROS CONTOS

«Identidade», conto poético por Matias José.

«Identidade»
Fusão/ Paul Richmong

IDENTIDADE (CAMÕES, ÉCLOGAS II)

E sou já do que fui tão diferente 
Que, quando por meu nome alguém me chama, 
Pasmo, quando conheço 
Que ainda comigo mesmo me pareço.

Luís Vaz de Camões

807- «IDENTIDADE»

Fui criança irrequieta,
Dois olhos pra mim era pouco…
Todo o mundo ficava louco,
E eu oculto em parte incerta.
Não queria sossegar à sesta
Pra incómodo de toda a gente,
Eu era gaiato resistente
Lutando contra o sono…
Foi assim, ano após ano,
E sou já do que fui tão diferente

Facilmente me agitava
Se havia novas à solta…
Toda a casa era revolta,
Comigo ninguém sossegava!
Encarcerado eu acabava
Mas pra mim não era drama,
Na verdade eu tinha fama
De sempre me safar…
Tantas vezes ouvi gritar
Que, quando por meu nome alguém me chama… 

Desse tempo de outrora
Pouco ou nada descortino…
Conta-se, e eu imagino,
Quão diferente de agora.
Tudo passa sem demora
Cada dia mais envelheço,
O que passou reconheço
Como sendo irreversível…
Por ser de todo impossível
Pasmo, quando conheço!

 Olho-me frente ao espelho
Não vejo mais quem fui…
O passado se dilui,
E com ele me esguelho.
Aceito bom conselho
De quem não desconheço,
Por ti bem que mereço
Não cair no esquecimento…
Digo com convencimento,
Que ainda comigo mesmo me pareço.

Matias José

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