«O Limite do Medo»
Excerto
1060- «O LIMITE DO MEDO»
[Excerto]
Os passos sublinhavam a iminência do perigo. Olavo estava
escondido num espaço exíguo, rezando para que não fosse descoberto. Com o
aproximar do som, encolheu-se ainda mais—como se tal fosse possível—fechou os
olhos e tapou os ouvidos para evitar ver e ouvir quem vinha para o matar.
Conseguira evitar aquele momento durante muito tempo—muitas
vezes com grande sacrifício—até que, por fim, entendera que não havia evitado
nada. Apenas prolongara o inevitável.
E o inevitável estava cada vez mais perto.
A porta abriu com um ranger irritante, quase em câmara
lenta, apesar de ter as dobradiças bem oleadas, e bateu na parede com um
estrondo que não fazia qualquer sentido perante as leis da lógica.
Indiferente às leis que acabara de violar e pronto a violar
mais algumas, o assassino entrou na sala minúscula. Bem disposto pelo acto que
estava prestes a cometer, começou a fazer girar a faca de mato enquanto chamava
pela sua presa.
“Onde é que está o meu pequenino? Onde está ele?”
Olavo fechou os olhos com mais força e tapou os ouvidos com
mais força ainda. Era um homem de cinquenta e três anos mas, naquele momento,
sentia-se como uma criança de cinco, aterrorizada e paralisada pelo medo.
Percorrendo a sala, o assassino foi verificando os possíveis
esconderijos.
“Está escondido, é? Olha que eu vou apanhar-te.”
A inevitabilidade da sua morte não era facto derivado da
eficácia ou eficiência de quem o perseguia. O seu assassino podia ser a pessoa
mais bronca do mundo, mas era difícil não ser apanhado quando não havia muito
sítio bom onde se esconder.
Como qualquer bom assassino que se prezasse, o seu
assassino—havia qualquer coisa de possessivo nisso—não espreitou
dentro do armário, não viu debaixo do sofá: os chamados sítios óbvios. Em vez
disso, sentou-se no sofá e fingiu lamentar-se:
“Ele está mesmo bem escondido! Acho que não o vou conseguir
encontrar vivo…”
Quebrando o seu monólogo, cravou a lâmina na almofada do
sofá e pressionou até ao fim. Ouviu os gritos de dor, abafados pelos estofos e
quando sentiu que Olavo estava na iminência de partir para outro mundo puxou a
lâmina, terminando com o seu suplício.
Ricardo Neves
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