«Estória do Ladrão e do Papagaio»
Excerto de Luandino Vieira
1157- «ESTÓRIA DO LADRÃO E PAPAGAIO»
[Excerto]
‘Pode mesmo a gente saber, com a certeza, como é um caso
começou, aonde começou, por quê, pra quê, quem? Saber mesmo o que estava se
passar no coração da pessoa que faz, que procura, desfaz ou estraga as
conversas, as macas?
Ou tudo que passa na vida não pode-se-lhe agarrar no
princípio, quando chega nesse princípio vê afinal esse mesmo princípio era
também fim doutro princípio e então, se a gente segue assim, para trás ou para
frente, vê que não pode partir o fio da vida, mesmo que está podre nalgum lado,
ele sempre se emenda noutro sítio, cresce, desvia, foge, avança, curva, para,
esconde, aparece... e digo isto, tenho minha razão.
As pessoas falam, as gentes que estão nas conversas, que
sofrem os casos e as macas contam, e logo ali, ali mesmo, nessa hora em que
passa qualquer confusão, cada qual fala a sua verdade e se continuam falar e
discutir, a verdade começa dar fruta, no fim é mesmo uma quinda de mentiras,
que a mentira é uma hora da verdade ou o contrário mesmo.
[...]
O fio da vida que mostra o quê, o como das conversas, mesmo
que está podre não parte. Puxando-lhe, emendando-lhe, sempre a gente encontra
um princípio num sítio qualquer, mesmo que esse princípio é o fim doutro
princípio. Os pensamentos, na cabeça das pessoas, têm ainda de começar em
qualquer parte, qualquer dia, qualquer caso. Só o que precisa é procurar saber.’
José Luandino Vieira
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