quinta-feira, 7 de abril de 2011

POESIA - GREGÓRIO DE MATOS

Gregório de Matos Guerra, alcunhado de «Boca de Inferno» ou «Boca de Brasa» devido às suas sátiras eróticas-obscenas, foi considerado o maior poeta brasileiro do período Barroco e o mais importante satírico da literatura portuguesa do seu tempo. Nasceu em Salvador da Baía, a 7 de Abril de 1636, e veio a falecer no Recife de Pernambuco, no ano de 1696. 
Poet'anarquista
Gregório de Matos
 Poeta Brasileiro
BIOGRAFIA
7/4/1633, Salvador (BA)
1696, Recife (PE)

«Que falta nesta cidade? Verdade./ Que mais por sua desonra? Honra./ Falta mais que se lhe ponha? Vergonha./O demo a viver se exponha/ Por mais que a fama a exalta/ Numa cidade onde falta/ Verdade, honra e vergonha.» Assim Gregório de Matos abre um poema criticando a Baía do seu tempo. A sátira política tornou-se uma das vertentes mais conhecidas da sua obra poética.

Gregório de Matos Guerra era o terceiro filho de um fidalgo português, estabelecido no Recôncavo baiano como senhor de engenho, e de uma brasileira. Ao contrário dos irmãos mais velhos que não se adequaram aos estudos e se dedicaram a ajudar o pai na fazenda, Gregório recebeu instrução na infância e adolescência e foi enviado para a Universidade de Coimbra, onde se bacharelou em direito.

Teria sido juiz do Cível, de Crime e de Órfãos em Lisboa durante muitos anos. Na Corte portuguesa, envolveu-se na vida literária que deixava o maneirismo camoniano e atingia o barroco, seguindo as influências espanholas de Gôngora e Quevedo. Por essa ocasião, teria também casado e tido acesso ao rei D. Pedro II, de quem ganhou simpatia e favores.

Sua sorte, porém, mudou bruscamente. Enviuvou e caiu em desgraça com o rei, segundo alguns biógrafos, por intriga de alguém ridicularizado num dos seus poemas satíricos. Acabou regressando à Baía em 1681, a princípio trabalhando para o Arcebispo, como tesoureiro-mór, mas logo desligado das suas funções.

Casou-se, então, com Maria dos Povos, a quem dedicou um dos seus sonetos mais famosos. Vendeu as terras que recebera de herança e, segundo consta, guardou o dinheiro num saco no canto da casa, gastando-o à vontade e sem fazer economia. Ao mesmo tempo, tratou de exercer a advocacia, escrevendo argumentações judiciais em versos.

A certa altura, resolveu abandonar tudo e saiu pelo Recôncavo como cantador itinerante, convivendo com o povo, frequentando as festas populares, banqueteando-se sempre que convidado. É nessa época que se avoluma a sua obra satírica (inclusive erótico-obscena) que iria lhe valer o apelido de "Boca do Inferno". Mas foi a crítica política à corrupção e o arremedo aos fidalgos locais que resultaram na sua deportação para Angola.

De lá, só pôde regressar em 1695, com a condição de se estabelecer em Pernambuco e não na Baía, além de evitar as sátiras. Segundo os estudiosos, nesses momentos finais de vida, tornou-se mais devoto e deu vazão à poesia religiosa, em que pede perdão a Deus pelos seus pecados. Morreu em data incerta no ano seguinte.

Vale lembrar que a fama de Gregório de Matos, um dos grandes poetas barrocos não só do Brasil, mas da língua portuguesa , é devida a uma obra efectivamente sólida, em que o autor soube manejar os cânones da época, seja de modo erudito em poemas líricos de cunho filosófico e religioso, seja na obra satírica de cunho popularesco. O virtuosismo estilístico de Gregório de Matos não encontra um rival à altura na poesia portuguesa do mesmo período.
Fonte: UOL Educação


NASCE O SOL E NÃO DURA MAIS QUE UM DIA

Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.

Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.

Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.


Gregório de Matos


CASOU-SE NESTA TERRA ESTA E AQUELE

Casou-se nesta terra esta e aquele.
Aquele um gozo filho de cadela, 
Esta uma donzelíssima donzela, 
Que muito antes do parto o sabia ele. 

Casaram por unir pele com pele; 
E tanto se uniram, que ele com ela 
Com seu mau parecer ganha para ela, 
Com seu bom parecer ganha para ele. 

Deram-lhe em dote muitos mil cruzados, 
Excelentes alfaias, bons adornos, 
De que estão os seus quartos bem ornados: 

Por sinal que na porta e seus contornos 
Um dia amanheceram, bem contados, 
Três bacias de trampa e doze cornos.

Gregório de Matos

À MARGEM DE UMA FONTE QUE CORRIA

À margem de uma fonte, que corria, 
Lira doce dos pássaros cantores 
A bela ocasião das minhas dores 
Dormindo estava ao despertar do dia. 

Mas como dorme Sílvia, não vestia 
O céu seus horizontes de mil cores; 
Dominava o silêncio entre as flores, 
Calava o mar, e rio não se ouvia, 

Não dão o parabém à nova Aurora 
Flores canoras, pássaros fragrantes, 
Nem seu âmbar respira a rica Flora. 

Porém abrindo Sílvia os dois diamantes, 
Tudo a Sílvia festeja, tudo adora 
Aves cheirosas, flores ressonantes.

Gregório de Matos

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