sexta-feira, 26 de novembro de 2010

MÁRIO CEZARINY

Foi no dia 26 de Novembro de 2006 que faleceu Mário Cesariny de Vasconcelos, poeta e pintor, e uma das figuras mais notáveis da cultura portuguesa.
Poet'anarquista
Mário Cesariny
Poeta e Pintor
BIOGRAFIA

Mário Cesariny de Vasconcelos (Lisboa, 9 de Agosto de 1923 — Lisboa, 26 de Novembro de 2006) foi pintor e poeta, considerado o principal representante do surrealismo português. É de destacar também o seu trabalho de antologista, compilador e historiador (polémico) das actividades surrealistas em Portugal.

Mário Cesariny de Vasconcelos nasceu, por acaso, na Vila Edith, na Estrada da Damaia, em Benfica, onde os pais estavam a passar férias. Último filho (três irmãs mais velhas) de Viriato de Vasconcelos, natural de Tondela, e de Mercedes Cesariny Vasconcelos (de ascendência paterna corsa e materna espanhola), natural de Paris. O pai, com uma personalidade dominadora e pragmática, era empresário ourives, com loja e oficina na rua da Palma, na freguesia de Santa Justa, em plena baixa lisboeta.

Depois da escola primária, o jovem Mário frequentou durante um ano o Liceu Gil Vicente, após o que o pai (que o queria ourives) o mudou para um curso de cinzelagem na Escola de Artes Decorativas António Arroio (onde conheceu Artur do Cruzeiro Seixas e Fernando José Francisco), que completou. Depois, como não lhe agradasse o trabalho de ourives, frequentou um curso de habilitação às Belas-Artes. Também estudou música, gratuitamente, com o compositor Fernando Lopes Graça. Cesariny era um talentoso pianista, mas o pai, enfurecido, proibiu-o de continuar esses estudos. Entretanto, no final da adolescência, Cesariny e os amigos frequentam várias tertúlias nos cafés de Lisboa e descobrem o neo-realismo e depois o surrealismo.

Em 1947, Cesariny viaja até Paris onde frequenta a Académie de la Grande Chaumière e conhece André Breton, cuja influência o leva a criar no mesmo ano o Grupo Surrealista de Lisboa, juntamente com figuras como António Pedro, José Augusto França, Cândido Costa Pinto, Vespeira, Moniz Pereira e Alexandre O´Neill. Este grupo surgiu como forma de protesto libertário contra o regime salazarista e contra o neo-realismo, dominado pelo Partido Comunista Português, de tendência estalinista. Mais tarde, funda o anti-grupo (dissidente)"Os Surrealistas" do qual fazem parte entre outros os seguintes autores António Maria Lisboa, Risques Pereira, Artur do Cruzeiro Seixas, Pedro Oom, Fernando José Francisco e Mário-Henrique Leiria.

Na década de 1950, Cesariny dedica-se à pintura, mas também, e sobretudo, à poesia, que escreve nos cafés. O seu editor é Luiz Pacheco, com quem mais tarde (nos anos 1970) se incompatibilizaria por completo. É também durante esse período que começa a ser incomodado e a ser vigiado pela Polícia Judiciária, por "suspeita de vadiagem", obrigado a humilhantes apresentações e interrogatórios regulares, devido à sua homossexualidade, que vivencia diariamente, de modo franco e destemido. Só a partir de 25 de Abril de 1974 deixará de ser perseguido e atormentado pela polícia.

Cesariny vivia com dificuldades financeiras, ajudado pela família. Apesar da excelência da sua escrita, esta não o sustentava financeiramente e Cesariny, a partir de meados dos anos 1960, acabaria por se dedicar por inteiro à pintura, como modo de subsistência.

A partir da década de 1980, a obra poética de Cesariny é reeditada pelo editor Manuel Hermínio Monteiro e redescoberta por uma nova geração de leitores.

Nos últimos anos da sua vida, Cesariny viveu com a sua irmã mais velha, Henriette (falecida em 2004). Ao contrário do que acontecia anteriormente, abriu-se aos meios de comunicação dando frequentes entrevistas e falando sobre a sua vida íntima. Em 2004, Miguel Gonçalves Mendes realizou o documentário Autografia, filme intenso e comovente onde Cesariny se expõe e revela de modo total.

Mário Cesariny morreu em 26 de Novembro de 2006, às 5h30, de cancro da próstata, de que sofria havia anos. Doou em vida o seu espólio à Fundação Cupertino de Miranda e, por testamento, deixou um milhão de euros à Casa Pia.

OBRA

Mário Cesariny adopta uma atitude estética de constante experimentação nas suas obras e pratica uma técnica de escrita e de (des)pintura amplamente divulgada entre os surrealistas. A sua poesia é animada por um sentido de contestação a comportamentos e princípios institucionalizados ou considerados normais nos campos do pensamento e dos costumes. Ao recorrer a processos tipicamente surrealistas (enumerações caóticas, utilização sistemática do sem-sentido ou do humor negro, formas paródicas, trocadilhos e outros jogos verbais, automatismo, etc.) alcança uma linguagem que sabe encontrar o equilíbrio entre o quotidiano e o insólito.  Introduz também a técnica designada “cadáver esquisito”, que consiste na construção de uma obra por três ou quatro pessoas, num trabalho em cadeia criativa em que cada um dá continuidade, em tempo real, à criatividade do anterior, conhecendo apenas parte do que este fez.

Nos últimos anos de vida, desenvolveu uma frenética actividade de transformação e reabilitação do real quotidiano, da qual nasceram muitas colagens com pinturas, objectos, instalações e outras fantasias materiais.

Sobre as sessões para que o convidavam e em que o aplaudiam, o poeta comentava: Estou num pedestal muito alto, batem palmas e depois deixam-me ir sozinho para casa. Isto é a glória literária à portuguesa.
Fonte: Wikipédia
MÁRIO CESARINY
Faz-me o favor...
 
Faz-me o favor de não dizer absolutamente nada!
Supor o que dirá
Tua boca velada
É ouvir-te já.
 
É ouvir-te melhor
Do que o dirias.
O que és não vem à flor
Das caras e dos dias.
 
Tu és melhor -- muito melhor! -  
Do que tu. Não digas nada. Sê
Alma do corpo nu
Que do espelho se vê.

MÁRIO CESARINY
MÁRIO CESARINY

Em todas as ruas te encontro

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco

MÁRIO CESARINY





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