No dia 19 de Dezembro de 1924, nasce na cidade de Lisboa o poeta surrealista português de ascendência irlandesa, Alexandre O’Neill. Foi ele o autor do famoso lema publicitário: «Há mar e mar, há ir e voltar»... quem não se lembra? Pode consultar aqui- «POESIA- ALEXANDRE O'NEILL» para ficar a conhecer um pouco mais da vida e obra deste grande poeta português e publicitário.
Poet’anarquista
AMIGO
Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.
«Amigo» é a solidão derrotada!
«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa!
Alexandre O’Neill
AOS VINDOUROS, SE OS HOUVER...
Vós, que trabalhais só duas horas
a ver trabalhar a cibernética,
que não deixais o átomo a desoras
na gandaia, pois tendes uma ética;
que do amor sabeis o ponto e a vírgula
e vos engalfinhais livres de medo,
sem peçários, calendários, Pílula,
jaculatórias fora, tarde ou cedo;
computai, computai a nossa falha
sem perfurar demais vossa memória,
que nós fomos pràqui uma gentalha
a fazer passamanes com a história;
que nós fomos (fatal necessidade!)
quadrúmanos da vossa humanidade.
Alexandre O’Neill
A MORTE, ESSE LUGAR-COMUM
É trivial a morte e há muito se sabe
fazer - e muito a tempo! - o trivial.
Se não fui eu quem veio no jornal,
foi uma tosse a menos na cidade...
A caminho do verme, uma beldade
— não dirias assim, Gomes Leal? —
vai ser coberta pela mesma cal
que tapa a mais intensa fealdade.
Um crocitar de corvo fica bem
neste anúncio de morte para alguém
que não vê n'alheia sorte a própria sorte...
Mas por que não dizer, com maior nojo,
que um menino saiu do imenso bojo
de sua mãe, para esperar a morte?...
Alexandre O’Neill
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