«O Menino e a Fonte»
Juan
Ramón Jiménez – Platero e Eu, Cap. XLII
1029- «O MENINO E A FONTE
[Excerto]
«Na aridez abrasada de sol do grande lago poeirento que, por
mais leve que se pise, cobre a gente, até os olhos, de branca poeira peneirada,
o menino e a fonte formam um grupo risonho e esplêndido, cada qual com a sua
alma. Embora ali não haja uma única árvore, o coração, em chegando, se enche de
uma palavra que os olhos fixam, gravada no céu azul da Prússia, com grandes
letras de luz: OÁSIS.
A manhã já tem um calor de sesta e a cigarra chia nas
oliveiras, para as bandas do cercado de San Francisco. O sol bate em cheio na
cabeça do menino. Ele, porém, distraído com a água, não sente.
Estendido no chão, está com a mão sob o jorro vivo, e a água
lhe põe na palma um borbotante tesouro de frescura e de graça que seus negros
olhos comtemplam em êxtase. Fala sozinho, respira fundo, coça-se aqui e ali,
com a outra mão. O tesouro, sempre igual e diferente sempre, desfaz-se às
vezes.
O menino, então, se retrai, apruma-se, concentra-se para que
nem essa pulsação do sangue que, como um espelho que se movesse sozinho, muda a
sensível imagem do calendoscópio, roube à água a primitiva forma surpreendida.
Platero, não sei se entenderás ou não o que te digo: mas
esse menino tem a minha alma em sua mão».
Juan Ramón Jiménez
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