«O Barão»
Romance de Branquinho da Fonseca
1098- «O BARÃO»
[Introdução]
“Não gosto de viajar. Mas sou inspector das escolas de
instrução primária e tenho obrigação de correr constantemente todo o País. Ando
no caminho da bela aventura, da sensação nova e feliz, como um cavaleiro
andante. Na verdade lembro-me de alguns momentos agradáveis, de que tenho
saudades, e espero encontrar outros que me deixem novas saudades. É uma
instabilidade de eterna juventude, com perspectivas e horizontes sempre
novos. Mas não gosto de viajar. Talvez só por ser uma obrigação e as
obrigações não darem prazer.
Entusiasmo-me com a beleza das paisagens, que valem como
pessoas, e tive já uma grande curiosidade pelos tipos rácicos, pelos costumes,
e pela diferença de mentalidade do povo de região para região. Num país tão
pequeno, é estranhável tal diversidade. Porém não sou etnógrafo, nem
folclorista, nem estudioso de nenhum desses aspectos e logo me
desinteresso.
Seja pelo que for, não gosto de viajar. Já pensei em pedir a
demissão. Mas é difícil arranjar outro emprego equivalente a este nos
vencimentos. Ganho dois mil escudos e tenho passe nos comboios, além das ajudas
de custo. Como vivo sozinho, é suficiente para as minhas necessidades. Fazer
algumas economias e, durante o mês de licença que o Ministério me dá todos os
anos, poderia ir ao estrangeiro. Mas não vou. Não posso. Durante esse mês quero
estar quieto, parado, preciso de estar o mais parado possível. Acordar todas
essas trinta manhãs no meu quarto! Ver durante trinta dias seguidos a
mesma rua! Ir ao mesmo café, encontrar as
mesmas pessoas!... Se soubessem como é bom! Como dá uma calma interior e
como as ideias adquirem continuidade e nitidez! Para pensar bem é preciso
estar quieto.
Talvez depois também cansasse, mas a natureza exige
certa monotonia. As árvores não podem mexer-se. E os animais só por necessidade
física, de alimento ou de clima, devem sair da sua região. Acerca disto tenho
ideias claras e uma experiência definitiva. É até, talvez, a única coisa sobre
que tenho ideias firmes e uma experiência suficiente. Mas não vou filosofar;
vou contar a minha viagem à serra do Barroso.”
Branquinho da Fonseca
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