quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

OUTROS CONTOS

«O Pesadelo», por Leunam d'Orig.

«O Pesadelo»
Príncipe, o Perfeito

1243- «O PESADELO»

Todos os dias a rotina habitual de Matias sucedia-se… depois do almoço no local de trabalho, dirigia-se ao prédio onde morava para apanhar seu cachorro, e dar o passeio pelas cercanias a fim de o animal fazer as suas necessidades.

Naquele dia, quando Matias abriu a porta para sair com seu cachorro, o vizinho da frente interpelou-o bruscamente dizendo vários impropérios sobre o cão, chegando ao cúmulo de o ameaçar com uma faca de serrilha.

Não era a primeira vez que tal sucedia, e Matias perdeu a paciência e o ofendeu. Chamou-lhe canalha, que não tinha coração e que só estava feliz a arranjar problemas onde não existiam.

Matilde, a vizinha do andar de cima descia as escadas nesse momento e presenciou a cena pouco amistosa entre o velho homem e Matias, de quem era amiga há largos anos.

Lá o acalmou conseguindo que ele descesse as escadas do prédio até ao rés-de-chão, e seguir viagem para dar o passeio habitual com seu cachorro.

Matias interpelou-a:

- Matilde, você ouviu eu gritar que ele me estava apontando uma faca?

-Sim, Matias… mas já passou, agora acalma-te e vai passear o teu Príncipe que não tarda são horas de regressares ao trabalho.

- Obrigado, Matilde… dá cá um beijo, tu tens o condão de me tranquilizar. Se não fosses tu aparecer na altura certa, parece-me que o velho não se escapava de levar um par de estalos.

Todas as noites Matias descansava trancado a sete chaves. Como se não bastasse trancar a porta de entrada da casa, trancava igualmente a porta do corredor que dava acesso ao quarto, e a porta do seu quarto. Matias vivia trancado na sua própria casa, e as noites eram de enorme agitação até adormecer. Para conseguir descansar sem aquela maldita ansiedade que lhe apertava o peito, engolia como era hábito todas as noites o respectivo comprimido perto da meia-noite.

Naquela noite de treze para catorze de Março, depois das ameaças que lhe tinha feito o velho homem pela hora de almoço, Matias estava mais inquieto do que era normal. Deitou-se perto da meia-noite, tomou em vez de um, dois comprimidos, e caiu num sono profundo.

Ouviu-se uma primeira chave abrir uma fechadura e o ranger de porta… depois, sucessivamente, uma e outra fechaduras até se encontrar no interior do quarto onde Matias dormia a sono solto.

Uma lanterna se acendeu direccionada para a cama onde Matias descansava focando o seu rosto adormecido. Nesse instante Matias acordou ficando petrificado e imóvel… não voltaria a acordar novamente para a vida. Uma primeira facada no peito, seguida de outras quantas  na mesma zona, até que se ouviu uma voz suave e doce deslizar:

- Querido, muitos parabéns pelo dia catorze de Março, dia do teu aniversário, recebe com agrado a décima quarta facada que te desfiro. Com amor, tua amiga de sempre…

O Príncipe, encerrado no quarto dos fundos, fazia ouvir os seus uivos por todo o prédio e arredores…

Não mais teria o prazer de passear com seu amigo Matias.

Leunam d'Orig

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