segunda-feira, 21 de março de 2016

OUTROS CONTOS

«Teatro Simbólico dos Contos Maravilhosos», por António Quadros.

«Teatro Simbólico 
dos Contos Maravilhosos»
Ilustração de Gustave Doré

761- «TEATRO SIMBÓLICO DOS CONTOS MARAVILHOSOS»

Pretendeu-se que o conto maravilhoso constituía uma falsificação da realidade, pura e simplesmente porque narrava mentiras. Mesmo se entendido simbolicamente, tal género de literatura podia ser perigoso, pois daria talvez acesso a um sem-número de alienações na idade adulta: escapismo, perda de sentido do concreto, imaginação doentia, distanciação da realidade... as crianças, contudo, resistiram.

(...)

O deslumbramento perante o desconhecido, a atracção pelo enigmático e pelo misterioso, a decisão do trabalho e da investigação desinteressada, a capacidade de fugir às tiranias do mundo burocrático e imediato, a virtualidade sempre aberta da intuição, do sonho, do ideal, a conservação de um olhar inocente perante a espessura das coisas ou perante a presença dos males, das angústias e das dificuldades, a sublimação dos impulsos instintivos em obra criadora e fecunda, a disponibilidade diante do inesperado e do insólito são apenas algumas, de entre muitas dádivas que as crianças recebem na infância, dos contos maravilhosos. 

(...) 

À laboração misteriosa do inconsciente se devem muitas vezes, tanto como à própria razão consciente, os inventos da ciência ou os conceitos da filosofia. 

(...) 

Talvez que, aos jovens das gerações de hoje tenham faltado os avós, as mães e as tias que sabiam contar histórias de fadas, pela calada da noite, a crianças palpitantes e deslumbradas.

(...)  

Talvez essa oportunidade perdida os tenha desequilibrado para sempre. Se não ressuscitamos o teatro simbólico dos contos maravilhosos, talvez o mundo pereça entre escombros, ou simplesmente se detenha, desgostado com a pobreza espiritual da humanidade nova...

António Quadros

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