903- «MEDITAÇÃO SOBRE UM CABO DE VASSOURA»
Esse cabo que você contempla agora jogado naquele canto, eu
uma vez o vi florescente numa floresta: ele estava cheio de seiva, cheio de
folhas, e cheio de ramos: mas agora, em vão tenta a ocupada arte humana porfiar
com a natureza, amarrando esse seco feixe de gravetos a seu tronco sem seiva:
agora ele é, quando muito, nada mais que o reverso daquilo que já foi, uma
árvore posta ao contrário, os ramos no chão, e a raiz no ar; agora ele é
manuseado por qualquer criada, condenado a fazer para ela um trabalho monótono,
e, por conta de um destino caprichoso, destinado a limpar outras coisas,
permanecendo ele mesmo deplorável: depois de um largo período, reduzido a um
toco pelo serviço das empregadas, ele é ou jogado fora, ou condenado a um
último uso, avivando alguma chama. Quando contemplei tal coisa, suspirei, e
disse para mim mesmo, “certamente o homem é como um Cabo de Vassoura!” A
natureza o mandou ao mundo forte e cheio de vida, em pleno desenvolvimento, com
seu próprio cabelo na cabeça, conveniente folhagem desse vegetal racional, até
que o machado da intemperança venha cortar seus ramos e deixá-lo com um tronco
seco: ele então volta-se para as artes, põe uma peruca, se auto-valorizando com
um cacho de cabelo artificial (e com o rosto todo coberto de pó), cabelo que
não cresceu em sua cabeça; mas agora que nosso cabo de vassoura pretende entrar
em cena, orgulhoso das características de faia que nunca teve, e todo coberto
de poeira, apesar da limpeza empreendida no quarto da mais fina dama, devemos
estar aptos a ridicularizar e desprezar sua vaidade. Como somos juízes parciais
de nossas próprias excelências e dos defeitos dos outros!
Mas um cabo de vassoura, talvez, você dirá, é um emblema de
uma árvore de cabeça para baixo; quanto ao homem, não passa de uma criatura
invertida, suas faculdades animais perpétuamente instaladas em sua
racionalidade, sua cabeça onde os calcanhares deveriam estar, humilhando-se
sobre a terra! E mesmo assim, com todos os defeitos, ele ergue-se para ser um
reformador universal e corretor de abusos, um eliminador de ofensas, que limpa
todo canto prostituído da natureza, trazendo corrupções escondidas à luz, e
levanta uma poderosa poeira onde antes não havia nenhuma; sempre compartilhando
profundamente da poluição que ele pretende varrer; seus últimos dias são
consumidos sob a escravidão de mulheres, e geralmente sob as que menos merecem;
até que, reduzido a um toco, ele é ou chutado fora, ou usado para avivar chamas
ao redor das quais outros podem se aquecer.
Jonathan Swift
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