«Ladrão de Sábado»
Conto de Gabriel García Márquez
337- «LADRÃO DE SÁBADO»
Hugo, um ladrão que somente rouba nos fins-de-semana, entra
numa casa num sábado de noite. Ana, a dona, uma linda mulher de trinta e poucos
anos e insone empedernida, o descobre em flagrante.
Ameaçada com a pistola, a
mulher lhe entrega todas as jóias e coisas de valor, e lhe pede que não se
aproxime da Pauli, sua filha de três anos. Mas a menina o vê e ele a conquista
com alguns truques de mágica. Hugo pensa: “Por quê ir embora tão rápido, se
aqui se está tão bem?” Poderia ficar todo o fim-de-semana e gozar plenamente a
situação, pois o marido- sabe porque esteve espiando-lhes- não retorna da sua
viagem de negócios até o domingo de noite. O ladrão não reflecte muito: veste as
calças do senhor da casa, pede a Ana que cozinhe pra ele, que providencie um
vinho da adega e que ponha algo de música para jantar, porque sem música não
pode viver. A Ana, preocupada por Pauli, enquanto prepara o jantar tem uma
ideia para tirar esse tipo da sua casa. Mas não pode fazer muito porque o Hugo
cortou os fios do telefone, a casa está longe de tudo, é de noite e ninguém vai
vir visitá-la a essa hora. Ana decide por um remédio pra dormir na taça do
Hugo. Durante o jantar, o ladrão, que durante a semana é segurança de um banco,
descobre que a Ana é condutora do seu programa favorito de rádio, o programa de
música popular que ouve todas as noites, sem falta. Hugo é um grande admirador
seu, então enquanto escutam ao grande Benny, cantando ‘Cómo fue’
numa fita cassete, falam sobre música e músicos. Ana arrepende-se de
adormecê-lo pois o Hugo comporta-se tranquilamente e não tem intenções de
machucá-la ou estuprá-la. Porém já é tarde demais porque o sonífero está na
taça e o ladrão está bebendo muito contente. Não obstante, houve um erro, e
quem tomou a taça com o remédio foi a própria Ana. Ela adormeceu num piscar de
olhos.
No dia seguinte, Ana acorda completamente vestida, muito bem coberta com
uma colcha, no seu quarto. No jardim, Hugo e Pauli brincam, depois de terem
tomado café da manhã. Ana surpreende-se com o bem que se dão. Além do mais,
adora como cozinha o tal ladrão que, afinal de contas, é bem atraente.
Ana começa a sentir uma bizarra felicidade. Nesse momento
uma amiga passa por sua casa para convidá-la a almoçar. Hugo fica nervoso mas a
Ana inventa que a filha está doente e a dispensa imediatamente. Assim os três
ficam juntinhos em casa, curtindo o domingo. Hugo conserta as janelas e o
telefone que estragou na noite anterior, enquanto assobia. Ana fica sabendo que
ele dança muito bem ‘odanzón’, dança que ela adora mas nunca pôde praticar com
ninguém. Ele propõe que dancem uma canção e se ajustam de tal maneira que
chegam até a madrugada. Pauli os observa, aplaude e finalmente cai no sono.
Rendidos, acabam tirados num sofá da sala. Mas, como previsto, é hora do
marido voltar pra casa. Ainda que Ana se resista, Hugo devolve quase tudo o que
havia roubado, dá alguns conselhos para evitar que entrem outros ladrões, e
despede-se das duas mulheres com muita tristeza. Ana olha-o enquanto se
distancia. Hugo já quase sumiu e ela de repente o chama aos gritos.
Quando ele
retorna lhe diz, fitando-o, que no próximo fim-de-semana seu marido vai de
viagem de novo. O ladrão de sábado vai embora feliz, dançando pelas ruas do
bairro, enquanto anoitece.
Gabriel García Márquez
2 comentários:
Garcia Marquéz sempre bizarro e inesperado!
Um amigo
👏👏👏
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