sábado, 15 de março de 2014

«LINGUAJAR», POR MANEL CALADO

V e último capítulo de «Linguajar», quadras populares do poeta de Rio de Moinhos, Manel Calado. Aproveite para uma consulta dos postes anteriores, e assim fazer leitura completa das quadras publicadas em cinco capítulos. Agradeço ao amigo Manel pela partilha da sua poesia neste espaço das artes!
Poet'anarquista
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Poet'anarquista

São Tiago Rio de Moinhos
Ali nas Abas da Serra D'Ossa

PS. Todas as pequenas comunidades, sobretudo as mais isoladas, desenvolvem características peculiares, em termos de linguajar. Rio de Moinhos, também. 

Há anos que, com minha irmã, tentamos reunir algumas expressões e termos mais específicos.

Ultimamente, tenho-me divertido a fazer quadras ao gosto popular, usando as entradas desse dicionário Arregoteiro- Português.
Manel Calado
LINGUAJAR...

Um daqueles dias chatos
Malazengo, esbagachado
Agarrei nos quatarratos
Fui pregar para outro lado

Esmarniquei-me um dia
Lá na cartêra da vida
Se eu pudesse (não podia)
Voltava ao ponto de partida.

Pensam que tou arrumado
Alguns palermas cancelões 
Cá vou cantando o mê fado:
Que se lixem os cabrões

Os ecos acariámos 
Da infância, com saudade
Aguçosos, namorámos
Dizeres da mocidade

Da freguesia ao meio mundo
Um saltinho de pardal
Trocadilho tão profundo
Como Entrudo no Natal.

Com uma candeia postiça
Mascarrei-me de arencú
E lá na Rua da Fondiça
Desatei ao batacú

Saudades da contradança
E dos balhos só de cante
Se o Labiza ia a França
Não há nada que me espante

Andava todo enfluído
Para receber uma mucanca
Mas acabei confrengido
Mais pobre que o Padre Chanca

Valeu-me o Mestre Sala
Que me disse, empandinando,
Essa mecha não me rala
Tá na hora, vou-me andando…

Todo coxo e todo roxo
Com cirôlas de farnela
Arrala-te chibo moxo
Filho da cabra amarela

Os meus versos diz que são
Negócios de junça podre
Talvez por isso é que não
Sou gorducho como um odre

Quéjêros da freguesia
Na saem do cabanejo
Labutam no dia a dia
É pão, pão e queijo, queijo

Meu pai era alavoeiro
Prás bandas do Landroal
Meu avô era cabreiro
E na tinha puvial…

Já mexi munto almêce
Dei o rescaldão aos guichas
Mas quem sobe, também dece
Vamos ver se na te lixas…

Dúzia e meia de larachas
Para matar a soidade
Mana, diz-me o que achas
Vale a pena, de verdade?

Mas nesta acosião
Entre suspiros e ais
Quem quer mais vai a Pardais
E acabou a inspiração.

Manel Calado

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