«Jacarta», por Alice Munro.
A escritora canadense Alice Munro, de 82 anos, foi a grande vencedora do Prémio Nobel de Literatura 2013, atribuído pela Real Academia Sueca. Reconhecida pelo comité como «A Mestre dos Contos Contemporâneos», é a décima terceira mulher desde 1901 a vencer o prestigiado galardão. Publica-se excerto do conto «Jacarta», comemorando assim mais um Nobel da Literatura feminina. Muitos parabéns a Alice Munro!
Poet'anarquistaA escritora canadense Alice Munro, de 82 anos, foi a grande vencedora do Prémio Nobel de Literatura 2013, atribuído pela Real Academia Sueca. Reconhecida pelo comité como «A Mestre dos Contos Contemporâneos», é a décima terceira mulher desde 1901 a vencer o prestigiado galardão. Publica-se excerto do conto «Jacarta», comemorando assim mais um Nobel da Literatura feminina. Muitos parabéns a Alice Munro!
Alice Munro
Escritora Canadense, Nobel da Literatura 2013
SOBRE A AUTORA...
Munro nasceu em 10 de julho de 1931 na província canadense
de Ontário, onde se passam grande parte de seus contos. Sua mãe era professora
e o pai, fazendeiro.
Após terminar o colégio, começou a estudar Jornalismo e
Inglês na Universidade de Western Ontário, mas abandonou a faculdade quando se
casou com James Munro em 1951. O casal mudou-se para Victoria, onde abriu uma
livraria.
Embora tenha começado a escrever na adolescência, Munro só
publicou o seu primeiro livro, «Dance of the Happy Shades», em 1968. A obra
recebeu o «Governor General's Awards», prémio entregue pelo Conselho Canadense
para as Artes. A sua coleção de contos mais recente é «Dear Life», de 2012.
A Real Academia disse não ter conseguido falar com Munro
antes do anúncio oficial, como é de costume, e optado por deixar uma mensagem
na caixa postal. Horas depois, em entrevista à imprensa canadense, a autora
disse ter ficado surpresa com o prémio, que definiu como «maravilhoso». «Sabia
que estava no páreo, sim, mas nunca pensei que ganharia.»
Munro tem obras traduzidas para mais de dez idiomas. No Brasil,
foram publicados os livros «Ódio, amizade, namoro, amor, casamento» (2004),
«Fugitiva» (2006), «Felicidade Demais» (2010) e «O Amor de Uma Boa Mulher»
(2013).
Para 2014, estão previstos os lançamentos de «Selected
Stories», publicado originalmente em 1996, «The View of Castle Rock», de 2006,
e o relançamento de «Ódio, amizade, namoro, amor, casamento».
Munro também é conhecida pelo conto «The Bear Came Over the
Mountain», publicado na revista norte-americana «The New Yorker», que em 2006
foi adaptado pela também canadense Sarah Polley para o cinema. «Longe Dela»,
escrito e dirigido por Polley e estrelado por Julie Christie, recebeu duas
indicações ao Oscar.
Antes do Nobel, Munro ganhou outros prémios importantes como
o «Man Booker International Prize» pelo conjunto da obra, o «Commonwealth
Writers’ Prize» e o «American National Book Critics Circle Award».
Fonte: Último Segundo
Crianças Brincando em Rio
Jacarta/ Indonésia
3- JACARTA
(Excerto)
Kath e Sonje têm na praia um lugar só delas, atrás de uns
troncos grandes. Escolheram aquele sítio por ser abrigado do vento, por vezes
forte – trazem consigo o bebé de Kath – mas também para evitarem os olhares de
um grupo de mulheres que frequentam diariamente aquela praia. Kath e Sonje
chamam-lhes as Mónicas.
Cada uma das Mónicas tem dois, três ou quatro filhos.
Encontram-se todas sob a autoridade de uma Mónica autêntica, que da primeira
vez que viu Kath e Sonje com o bebé se dirigiu a elas para se apresentar,
convidando-as depois para se juntarem ao grupo.
Elas seguiram-na, levando entre si a alcofa do bebé. Que
alternativa tinham? Mas a partir daí passaram a esconder-se por trás dos
troncos.
O acampamento das Mónicas é feito de guarda-sóis, toalhas,
embalagens de fraldas, cestos de piquenique, barcos e baleias insufláveis,
brinquedos, cremes, roupa extra, chapéus para o sol, copos e pratos de papel e
sacos térmicos com gelados caseiros feitos de sumo de fruta.
No grupo, as que não estão claramente grávidas parecem-no,
com os seus corpos deformados. Caminham pesadamente até à beira da água,
enquanto gritam aos filhos, que cavalgam troncos e desabam do cimo de baleias
insufláveis.
“Onde puseste o chapéu? Onde puseste a bola? Pronto, já
brincaste o suficiente com isso, agora é a vez da Sandy.”
Mesmo quando falam entre si têm que levantar a voz, por
entre a gritaria das crianças.
“No Woodward’s, pelo preço de um hambúrguer compras carne
picada.”
“Experimentei com pomada de óxido de zinco, mas não
resultou.”
“Agora apareceu-lhe um abcesso nas virilhas.”
“Não podes usar fermento, tem que ser com bicarbonato de
soda.”
Estas mulheres não são muito mais velhas do que Kath e
Sonje, mas as suas vidas alcançaram um ponto que infunde pavor a ambas.
Convertem a praia inteira numa tribuna. Os seus sacos, a sua fiada de filhos e
cuidados maternais, a sua autoridade, podem destruir o brilho da água, a
pequena e perfeita baía marginada por arbutáceas de ramos vermelhos e por
cedros, que crescem torcidos sobre os altos penedos. Kath, em particular, sente
a ameaça daquelas mulheres, agora que é mãe. Para não se afundar no lodo da
mera função animal, tem o hábito de ler um livro enquanto dá a mama ao bebé, ou
então fuma um cigarro. E se amamenta, não o faz apenas para fornecer à filha –
Noelle – os preciosos anticorpos maternos, mas também para contrair o útero e
alisar a barriga.
Alice Munro
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