«O Cego e o Moço»
Conto de Teófilo Braga
182- «O CEGO E O MOÇO»
Um cego andava pedindo esmola pela mão de um moço; a uma
porta deram-lhe um naco de pão e um bocado de linguiça. O moço pegou no
pão e deu-o ao cego para metê-lo na sacola, e ia comendo a linguiça muito
à sorrelfa. O cego, desconfiado, pelo caminho começa a bradar com o moço:
– Ó grande tratante, cheira-me a linguiça! Acolá deram-me
linguiça e tu só me entregaste o pão.
– Pela minha salvação, que não deram senão pão.
– Mas cheira-me a linguiça, refinado larápio!
E começou a bater com o bordão no moço pancadas de criar
bicho. O moço era ladino e disse lá para si que o cego lhas havia de
pagar. Quando iam por uns campos onde estavam uns sobreiros, o moço
embicou o cego para um tronco, e grita-lhe:
– Salta, que é rego. O cego vai para saltar e bate com os
focinhos no sobreiro. Grita ele:
– Ó rapaz do diabo! Que te racho.
Diz-lhe ele:
Pois cheira-lhe o pão a linguiça,
E não lhe cheira o sobreiro à cortiça?
Teófilo de Braga
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