«O Porco»
Ilustração de Rafael Bordalo Pinheiro
544- «O PORCO»
Juro que não quis ofender o senhor Lavaccara, nem da
primeira nem da segunda vez, como andam a dizer na aldeia.
O senhor Lavaccara pôs-se a falar de um seu porco e queria convencer-me de que
era um animal inteligente.
Eu então perguntei-lhe:
– Desculpe, o porco é magro?
E eis que o senhor Lavaccara olha para mim como se a pergunta tivesse a
intenção de ofender, não o animal de que era proprietário, mas ele próprio.
Respondeu-me:
– Magro? Pesa mais de um quintal!
E eu então disse-lhe:
– Desculpe, julga que é inteligente?
Estávamos a falar do porco. Mas o senhor Lavaccara, com toda aquela sua rósea
fartura de carnes tremulantes, julgou que eu depois de ofender o porco o
quisesse ofender agora a ele, como se tivesse dito que em geral a gordura
exclui a inteligência. Mas, repito, era do porco que estávamos a falar.
Não
tinha pois nada o senhor Lavaccara que fazer uma cara tão feia, nem que
perguntar-me:
– Então eu, na sua opinião?…
Apressei-me a responder-lhe:
– Mas que é que o senhor tem que ver com isto, caro senhor Lavaccara? O senhor
é porventura um porco? Desculpe. Quando o senhor come com esse belo apetite que
Deus lhe conserve até ao fim da vida, para quem come? Come para si, não engorda
para os outros. O porco pelo contrário julga que come para ele e está mas é a
engordar para os outros.»
(…)
Luigi Pirandello
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