domingo, 19 de julho de 2015

OUTROS CONTOS

«Conheci-te», conto poético por José Agostinho Baptista.

«Conheci-te»
Poema de José Agostinho Baptista

566- «CONHECI-TE»

Conheci-te
quando eras apenas o viajante sem nome,
a rapariga admirável de Vera Cruz.

Devagar
toquei a tua fronte escura — 'te acuerdas?'
O rosto, a nuca húmida, os ombros,

descendo,
descendo sempre
até ao cálido refúgio, ao centro
onde me perdi.

Revejo-te na solidão de uma pátria febril,
nestas mãos de peregrino da meia idade,
no furor do meu sangue estrangeiro,
na inteligível voz de uma alma devastada.

Amei-te quanto pude
sobre a terra dos antepassados,
sob o olhar ferido da águia azteca,
sobrevoando
o tempo alto e azul,
atenta sobretudo à loucura de Jeremias,
o homem que sou.

Tudo aconteceu assim,
invariavelmente na planície sufocante e na pura
neve dos sonhos,
na penumbra das tardes do Pacífico e no Golfo
onde renunciámos à paixão e à vida.

Conheci-te
quando eras apenas o viajante sem nome,
a rapariga admirável de Vera Cruz.

 José Agostinho Baptista

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