O poeta português Afonso Lopes Vieira, nasceu em Leiria a 26
de Janeiro de 1878. Foi um dos primeiros representantes do Neo-Garrettismo e
esteve ligado à corrente Renascença Portuguesa. Tem o seu nome associado à
Biblioteca Municipal de Leiria, e a sua habitação em São Pedro de Moel foi
transformada em casa museu. Afonso Lopes Vieira faleceu em Lisboa, a 25 de Janeiro
de 1946.
Poet’anarquista
Afonso Lopes Vieira
Poeta Português
SOBRE O POETA…
Afonso Lopes Vieira (1878-1946) nasceu em Leiria, indo
viver para Lisboa com a família. Formou-se em Direito na Universidade de
Coimbra, exercendo funções de redactor da Câmara dos Deputados. Repartia o seu
tempo entre Lisboa e S. Pedro de Moel, Leiria – no Inverno em Lisboa, nos meses
mais aprazíveis em S. Pedro – , onde recebia vários amigos, também escritores.
Viajou por Espanha, França, Itália, Bélgica, norte de África
e Brasil. Esteve ligado à Renascença Portuguesa, sendo um dos principais
representantes do Neogarrettismo.
A Biblioteca Municipal de Leiria, designada como Biblioteca
Municipal Afonso Lopes Vieira, teve a sua origem na doação do espólio e
livraria privada do escritor à cidade natal.
Algumas obras: (1897), Náufragos, Versos Lusitanos (1898), O
Meu Adeus (1900), O Encoberto (1905), Canções do Vento e do
Sol (1911), Animais, Nossos Amigos (1911; ilustrações de Raul
Lino), Bartolomeu Marinheiro (1912; ilustrações de Raul Lino), Arte
Portuguesa (1916), Ilhas de Bruma (1917), País Lilás,
Desterro Azul (1922), Onde a Terra Acaba e o Mar Começa (1940).
Fonte: Projecto Vercial
DONA INÊS DE CASTRO
Choram ainda a tua morte escura
Aquelas que chorando a memoraram;
As lágrimas choradas não secaram
Nos saudosos campos da ternura.
Santa entre as Santas pela má ventura,
Rainha, mais que todas que reinaram,
Amada, os teus amores não passaram
E és sempre bela e viva e loira e pura.
Ó linda, sonha aí, posta em sossego
No teu momento de alva pedra tina,
Como outrora na Fonte do Mondego.
Dorme, sombra de graças e de saudade,
Colo de Graças, amor, moço menina,
Bem-amada por toda a eternidade!
Afonso Lopes Vieira
Os seus encantos - mar e floresta
Ilhas de Bruma
SAUDADES TRÁGICO-MARÍTIMAS
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Na praia, de bruços,
fico sonhando, fico-me escutando
o que em mim sonha e lembra e chora alguém;
e oiço nesta alma minha
um longínquo rumor de ladainha,
e soluços,
de além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
São meus Avós rezando,
que andaram navegando e que se foram,
olhando todos os céus;
são eles que em mim choram
seu fundo e longo adeus,
e rezam na ânsia crua dos naufrágios;
choram de longe em mim, e eu oiço-os bem,
choram ao longe em mim sinas, presságios,
de além, de além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Naufraguei cem vezes já...
Uma, foi na nau São Bento,
e vi morrer, no trágico tormento,
Dona Leonor de Sá:
vi-a nua, na praia áspera e feia,
com os olhos implorando
- olhos de esposa e mãe -
e vi-a, seus cabelos desatando,
cavar a sua cova e enterrar-se na areia.
- E sozinho me fui pela praia além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Escuto em mim, - oiço a grita
da rude gente aflita:
- Senhor Deus, misericórdia!
- Virgem Mãe, misericórdia!
Doidos de fome e de terror varados,
gritamos nossos pecados,
e sai de cada boca rouca e louca
a confissão!
- Senhor Deus, misericórdia!
- Misericórdia, Virgem Mãe!
e o vento geme
no vulcão
sem astros;
anoitecemos sem leme,
amanhecemos sem mastros!
E o mar e o céu, sem fim, além...
SAUDADES TRÁGICO-MARÍTIMAS
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Na praia, de bruços,
fico sonhando, fico-me escutando
o que em mim sonha e lembra e chora alguém;
e oiço nesta alma minha
um longínquo rumor de ladainha,
e soluços,
de além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
São meus Avós rezando,
que andaram navegando e que se foram,
olhando todos os céus;
são eles que em mim choram
seu fundo e longo adeus,
e rezam na ânsia crua dos naufrágios;
choram de longe em mim, e eu oiço-os bem,
choram ao longe em mim sinas, presságios,
de além, de além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Naufraguei cem vezes já...
Uma, foi na nau São Bento,
e vi morrer, no trágico tormento,
Dona Leonor de Sá:
vi-a nua, na praia áspera e feia,
com os olhos implorando
- olhos de esposa e mãe -
e vi-a, seus cabelos desatando,
cavar a sua cova e enterrar-se na areia.
- E sozinho me fui pela praia além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Escuto em mim, - oiço a grita
da rude gente aflita:
- Senhor Deus, misericórdia!
- Virgem Mãe, misericórdia!
Doidos de fome e de terror varados,
gritamos nossos pecados,
e sai de cada boca rouca e louca
a confissão!
- Senhor Deus, misericórdia!
- Misericórdia, Virgem Mãe!
e o vento geme
no vulcão
sem astros;
anoitecemos sem leme,
amanhecemos sem mastros!
E o mar e o céu, sem fim, além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Ah! Deus por certo conhece
minha voz que se ergue, branca e sozinha,
- flor de angústia a subir aos céus varados
p'la dor da ladainha!
Transijo, o clamor da prece
do mesmo sangue nos veio
Deus conhece os meus olhos alongados;
onde o mar e o céu deixaram
um pouco de vago anseio
nesse mistério longo do seu halo...
Rezam em mim os outros que rezaram,
e choraram também;
há um pranto português, e eu sei chorá-lo
com lágrimas de além...
minha voz que se ergue, branca e sozinha,
- flor de angústia a subir aos céus varados
p'la dor da ladainha!
Transijo, o clamor da prece
do mesmo sangue nos veio
Deus conhece os meus olhos alongados;
onde o mar e o céu deixaram
um pouco de vago anseio
nesse mistério longo do seu halo...
Rezam em mim os outros que rezaram,
e choraram também;
há um pranto português, e eu sei chorá-lo
com lágrimas de além...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Ó meu amor, repara
nos meus olhos, na sua mágoa clara!
Ainda é de além
o meu olhar de amor
e o meu beijo também.
Se sou triste, é de outrora a minha pena,
de longe a minha dor
e a minha ansiedade.
Vês como te amo, vês?
Meu sangue é português,
minha pele é morena,
minha graça a Saudade,
meus olhos longos de escutar sem fim
o além, em mim...
nos meus olhos, na sua mágoa clara!
Ainda é de além
o meu olhar de amor
e o meu beijo também.
Se sou triste, é de outrora a minha pena,
de longe a minha dor
e a minha ansiedade.
Vês como te amo, vês?
Meu sangue é português,
minha pele é morena,
minha graça a Saudade,
meus olhos longos de escutar sem fim
o além, em mim...
Chora no ritmo do meu sangue, o Mar
Afonso Lopes Vieira
Ilhas de Bruma
PINHAL DO REI
Catedral verde e sussurrante, aonde
a luz se ameiga e se esconde
e aonde, ecoando a cantar,
se alonga e se prolonga a longa voz do mar:
ditoso o «Lavrador» que a seu contento
por suas mãos semeou este jardim;
ditoso o Poeta que lançou ao vento
esta canção sem fim...
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
rei D. Dinis, bom poeta e mau marido,
lá vêm as veladas bailar e cantar.
Encantado jardim da minha infância,
aonde a minh' alma aprendeu;
a música do Longe e o ritmo da Distância
que a tua voz marítima lhe deu;
místico órgão cujo além se esfuma
no além do Oceano, e onde a maresia
ameiga e dissolve em bruma,
a luz se ameiga e se esconde
e aonde, ecoando a cantar,
se alonga e se prolonga a longa voz do mar:
ditoso o «Lavrador» que a seu contento
por suas mãos semeou este jardim;
ditoso o Poeta que lançou ao vento
esta canção sem fim...
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
rei D. Dinis, bom poeta e mau marido,
lá vêm as veladas bailar e cantar.
Encantado jardim da minha infância,
aonde a minh' alma aprendeu;
a música do Longe e o ritmo da Distância
que a tua voz marítima lhe deu;
místico órgão cujo além se esfuma
no além do Oceano, e onde a maresia
ameiga e dissolve em bruma,
e em penumbra de nave, a luz do dia.
Por estes fundos claustros gemem
os ais do Velho do Restelo...
Mas tu debruças-te no mar e, ao vê-lo,
teus velhos troncos de saudades fremem...
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
são as caravelas, teu corpo cortado,
é lo verde pino no mar a boiar.
Por estes fundos claustros gemem
os ais do Velho do Restelo...
Mas tu debruças-te no mar e, ao vê-lo,
teus velhos troncos de saudades fremem...
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
são as caravelas, teu corpo cortado,
é lo verde pino no mar a boiar.
Afonso Lopes Vieira
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