quinta-feira, 16 de abril de 2015

OUTROS CONTOS

«Arco-Íris», por Yasunari Kawabata.
«Arco-Íris»
Arco-Íris/ William Turner

477- «ARCO-ÍRIS»

(Capítulo I)

“Asako viu um arco-íris formar-se na margem oposta do lago Biwa.

O comboio tinha passado em Hikone e avizinhava-se de Maibara. Como muitas vezes acontece no fim do ano, ia meio vazio.

Quando se formara o arco-íris? Distraída, a contemplar a superfície do lago, Asako tinha a impressão de que surgira de repente.

O homem sentado em frente dela também se deu conta do arco-íris.

“Chiiko, Chiiko, olha o arco-íris! O arco-íris!”, exclamou ele, erguendo a criança que tinha nos braços e chegando-a à janela.

Desde que partira de Kyoto, Asako estava sentada num compartimento de quatro lugares diante daquele homem. O homem viajava com uma recém-nascida. Eram, pois, três.
Asako estava sentada perto da janela. O homem do lado do corredor.

Quando saíram do túnel de Higashiyama, ele deitara o bebé no assento, de modo a que estivesse com a cabeça apoiada nos joelhos dele, como numa almofada.

“Alto de mais,” murmurou dobrando o casaco. A criança estava tapada com um cobertorzinho de lã suave, com florzinhas. Agitava os braços e olhava para o pai. Ainda antes de subir para o comboio, Asako notara que o homem viajava sozinho com a menina. Sentara-se em frente dele imaginando que ia ter de o ajudar.

O homem, continuando a segurar a criança à janela e a motrar-lhe o arco-íris, disse a Asako:

“São raros os arco-íris no Inverno.”

“Ah, sim?”

Tinha-lhe falado de improviso e Asako ficara embaraçada.

“Não, não é verdade. Não são assim tão raros”, corrigiu o homem. “Já chegámos a Maibara.”

Uma vez, na linha para Horkuriku, depois de Maibara -nessa altura fazia o percurso contrário: de Kanazawa a Maibari e dali para Kyoto- vi pela janela imensos arco-íris. Na linha do Horkuriko não são raros. E eram todos pequeninos e gráceis. À saída de um túnel apareceu um pequeno arco-íris numa colina, depois viu-se o mar com outro arco-íris da colina à praia. Foi há três ou quatro anos, não recordo em que mês, mas era Inverno, estava frio e em Kanazawa caía uma neve como poeira. "

Asako perguntou a si própria se nessa altura o homem também viajava com a menina ao colo. Mas há três ou quatro anos, a criança ainda não tinha nascido. Deu-lhe vontade de rir.

“Quando se vê um arco-íris tem-se a impressão de estarmos entre a Primavera e o Verão.”

“Sim, todas estas cores não são invernais.”

“Vai para Kanazawa?”

“Hoje?”

“Sim.”

“Não, volto para Tóquio.”

“Acha que ela consegue ver o arco-íris? Não será inútil mostrar-lho?”, perguntou Asako. Era uma dúvida que lhe aparecera há uns minutos.

“Quem sabe?”, reflectiu alto o homem, “é difícil que o distinga, quer dizer, é impossível.”

“Mas vê-o, não?”

“Sim, vê. Mas aos recém-nascidos não interessa o que está longe.”

(...)

“Penso que a sua menina é feliz por viajar tão pequenina com um pai que lhe mostra o
arco-íris”.

“Mas não se vai recordar dele.”

“Será o senhor a lembrar-lho.”

“Sim, hei-de recordar-lho. Quando for grande, ela vai ter que viajar muito fazendo este percurso.”

A menina olhava para Asako e sorria.


“Mas quem sabe se lhe acontecerá voltar a ver um arco-íris no lago Biwa!” e o homem acrescentou, logo:

“Disse há pouco a palavra “feliz”. O ano está a acabar e para nós adultos o arco-íris é um auspício de felicidade. Talvez nos espere um ano feliz.”

Asako era da mesma opinião.

Desde que vira o arco-íris tinha vontade de atravessar para o lado de lá. Seria maravilhoso visitar na outra margem as terrinhas do arco-íris. Ou, talvez mais real, viajar ao longo da margem que tinha um naquele momento. Asako viajava bastante naquele percurso do comboio mas nunca se pusera a imaginar nada sobre a margem do lado de lá do lago Biwa.

O arco-íris parecia interrompido. Via-se uma extremidade mas o cume estava coberto por nuvens.

No céu, nuvens de neve escureciam o lago. Assentavam na margem oposta e desfaziam-e em baixo, deixando reflexos de luz, dos quais se filtravam, pousando na água, os fracos raios de sol.

A Asako parecia que o arco-íris se estendia para o céu, chamando as nuvens melancolicamente. Quanto mais o fixava, mais tinha essa impressão. O arco-íris desapareceu antes que chegassem a Maibara”.

Yasunari Kawabata

Sem comentários: