«Arco-Íris»
Arco-Íris/ William Turner
477- «ARCO-ÍRIS»
(Capítulo I)
“Asako viu um arco-íris formar-se na margem oposta do lago Biwa.
O comboio tinha passado em Hikone e avizinhava-se de
Maibara. Como muitas vezes acontece no fim do ano, ia meio vazio.
Quando se formara o arco-íris? Distraída, a contemplar a
superfície do lago, Asako tinha a impressão de que surgira de repente.
O homem sentado em frente dela também se deu conta do
arco-íris.
“Chiiko, Chiiko, olha o arco-íris! O arco-íris!”, exclamou
ele, erguendo a criança que tinha nos braços e chegando-a à janela.
Desde que partira de Kyoto, Asako estava sentada num
compartimento de quatro lugares diante daquele homem. O homem viajava com uma
recém-nascida. Eram, pois, três.
Asako estava sentada perto da janela. O homem do lado do corredor.
Quando saíram do túnel de Higashiyama, ele deitara o bebé no assento, de modo a que estivesse com a cabeça apoiada nos joelhos dele, como numa almofada.
“Alto de mais,” murmurou dobrando o casaco. A
criança estava tapada com um cobertorzinho de lã suave, com florzinhas. Agitava
os braços e olhava para o pai. Ainda antes de subir para o comboio, Asako
notara que o homem viajava sozinho com a menina. Sentara-se em frente dele
imaginando que ia ter de o ajudar.
O homem, continuando a segurar a criança à janela e a
motrar-lhe o arco-íris, disse a Asako:
“São raros os arco-íris no Inverno.”
“Ah, sim?”
Tinha-lhe falado de improviso e Asako ficara embaraçada.
“Não, não é verdade. Não são assim tão raros”, corrigiu
o homem. “Já chegámos a Maibara.”
Uma vez, na linha para Horkuriku, depois de Maibara -nessa
altura fazia o percurso contrário: de Kanazawa a Maibari e dali para Kyoto- vi
pela janela imensos arco-íris. Na linha do Horkuriko não são raros. E eram
todos pequeninos e gráceis. À saída de um túnel apareceu um pequeno arco-íris
numa colina, depois viu-se o mar com outro arco-íris da colina à praia. Foi há
três ou quatro anos, não recordo em que mês, mas era Inverno, estava frio e em
Kanazawa caía uma neve como poeira. "
Asako perguntou a si própria se nessa altura o homem também
viajava com a menina ao colo. Mas há três ou quatro anos, a criança ainda não
tinha nascido. Deu-lhe vontade de rir.
“Quando se vê um arco-íris tem-se a impressão de estarmos
entre a Primavera e o Verão.”
“Sim, todas estas cores não são invernais.”
“Vai para Kanazawa?”
“Hoje?”
“Sim.”
“Não, volto para Tóquio.”
“Acha que ela consegue ver o arco-íris? Não será inútil
mostrar-lho?”, perguntou Asako. Era uma dúvida que lhe aparecera há uns
minutos.
“Quem sabe?”, reflectiu alto o homem, “é difícil que o
distinga, quer dizer, é impossível.”
“Mas vê-o, não?”
“Sim, vê. Mas aos recém-nascidos não interessa o que está
longe.”
(...)
“Penso que a sua menina é feliz por viajar tão pequenina com
um pai que lhe mostra o
arco-íris”.
arco-íris”.
“Mas não se vai recordar dele.”
“Será o senhor a lembrar-lho.”
“Sim, hei-de recordar-lho. Quando for grande, ela vai ter
que viajar muito fazendo este percurso.”
A menina olhava para Asako e sorria.
“Mas quem sabe se lhe acontecerá voltar a ver um arco-íris
no lago Biwa!” e o homem acrescentou, logo:
“Disse há pouco a palavra “feliz”. O ano está a acabar e
para nós adultos o arco-íris é um auspício de felicidade. Talvez nos espere um
ano feliz.”
Asako era da mesma opinião.
Desde que vira o arco-íris tinha vontade de atravessar para
o lado de lá. Seria maravilhoso visitar na outra margem as terrinhas do
arco-íris. Ou, talvez mais real, viajar ao longo da margem que tinha um naquele
momento. Asako viajava bastante naquele percurso do comboio mas nunca se pusera
a imaginar nada sobre a margem do lado de lá do lago Biwa.
O arco-íris parecia interrompido. Via-se uma extremidade mas o cume estava
coberto por nuvens.
No céu, nuvens de neve escureciam o lago. Assentavam na
margem oposta e desfaziam-e em baixo, deixando reflexos de luz, dos quais se
filtravam, pousando na água, os fracos raios de sol.
A Asako parecia que o arco-íris se estendia para o céu,
chamando as nuvens melancolicamente. Quanto mais o fixava, mais tinha essa
impressão. O arco-íris desapareceu antes que chegassem a Maibara”.
Yasunari Kawabata
Yasunari Kawabata
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