terça-feira, 25 de março de 2014

OUTROS CONTOS

«A Vingança do Prestidigitador», por Stephen Leacock.

«A Vingança do Prestidigitador»
Conto de Stephen Leacock

112- «A VINGANÇA DO PRESTIDIGITADOR»

— Agora, senhoras e senhores — disse o mágico —, tendo-lhes mostrado que este pano está absolutamente vazio, passo a retirar dele um aquário de peixes dourados. Pronto!
Em torno dele, a assistência comentava:
— Que maravilha! Como será que ele faz?
Mas o Homem Sabido da cadeira da frente disse, num cochicho audível, às pessoas ao lado:
— Ele o tinha escondido na manga.
Então a assistência fez ao Homem Sabido, com a cabeça, um sinal de concordância inteligente, e disse:
— Claro!
E todos cochicharam pelo salão:
— Ele o tinha escondido na manga.
— Agora, a minha mágica — disse o prestidigitador — são as famosas argolas hindustânicas. Observem que as argolas estão, evidentemente, separadas; um sopro, e ei-las juntas (tlim, tlim tlim)... Presto!
Houve um murmúrio geral de estupefação, até que se ouviu o Homem Sabido murmurar:
— Ele devia ter outras argolas escondidas na manga.
Outra vez todos concordaram com a cabeça, e cochicharam:
— As argolas estavam na manga dele.
O semblante do mágico anuviou-se, com um franzir de sobrancelhas.
— Agora — continuou — vou-lhes mostrar uma mágica bem divertida, que me permite retirar de um chapéu qualquer quantidade de ovos. Um dos cavalheiros aqui presentes poderia ter a gentileza de emprestar-me o seu chapéu? Ah, muito obrigado... Presto!
Extraiu dezessete ovos, e durante trinta e cinco segundos a assistência começou a pensar que ele era maravilhoso. E então o Homem Sabido cochichou pelo banco da frente:
— Ele tem uma galinha escondida na manga.
E todo mundo cochichou adiante a novidade:
— Ele tem uma porção de galinhas escondidas na manga.
A mágica dos ovos foi um desastre.
E o espetáculo continuou mais ou menos assim. Pelos cochichos do Homem Sabido, percebeu-se que o mágico devia ter escondido na manga, além das argolinhas e peixes, diversos baralhos, um pão, um berço de boneca, um porquinho-da-índia vivo, uma moeda de cinqüenta centavos e uma cadeira de balanço.
A reputação do mágico descera rapidamente abaixo de zero. Pelo fim da noite, ele reanimou-se para um esforço final:
— Minhas senhoras e meus senhores, para terminar, apresentarei uma formosa mágica japonesa, recentemente inventada pelos habitantes de Tipperary. O cavalheiro aí — continuou, dirigindo-se ao Homem Sabido —, o cavalheiro quer ter a bondade de entregar-me o seu relógio de ouro?
O relógio foi-lhe entregue.
— O cavalheiro me autoriza a colocá-lo neste almofariz e a despedaçá-lo? — perguntou, fulo de raiva.
O Homem Sabido disse que sim com a cabeça, e sorriu.
O mágico atirou o relógio no almofariz e agarrou um malho que se achava em cima da mesa. Ouviu-se um barulho de algo esmagado com violência.
— Ele o escondeu na manga — cochichou o Homem Sabido.
— Agora, cavalheiro — continuou o mágico —, permite-me tomar o seu lenço e esburacá-lo? Obrigado. Vejam, senhoras e senhores, não há engano possível; todos estão vendo os buracos.
O Homem Sabido estava radiante. Desta vez o mistério real da coisa fascinava-o.
— E agora, cavalheiro, quer ter a bondade de passar-me o seu chapéu de seda e permitir-me dançar em cima dele? Obrigado.
O mágico fez alguns passes rápidos, desta vez com os pés, e exibiu o chapéu, irreconhecível de tão amassado.
— E agora, cavalheiro, quer ter a bondade de retirar seu colarinho de celulóide e permitir-me queimá-lo com a vela? Obrigado, cavalheiro. E permite-me espatifar os seus óculos com o meu martelo? Obrigado.
Por essas alturas, as feições do Homem Sabido estavam tomando uma expressão de perplexidade.
— Não compreendo este negócio — cochichou. — Não consigo entendê-lo nem um pouquinho.
Fez-se grande silêncio no auditório. Então o mágico se empertigou em toda a sua estatura e, com um olhar fulminante para o Homem Sabido, concluiu:
— Senhoras e senhores, queiram observar que, com a permissão deste cavalheiro, quebrei-lhe o relógio, queimei-lhe o colarinho, espatifei-lhe os óculos e dancei-lhe em cima do chapéu. Se ele me permitir ainda pintar-lhe o sobretudo de listras verdes e dar-lhe um nó nos suspensórios, ficarei encantado em poder divertir os meus espectadores. Caso contrário, está terminado o espetáculo.
Envolto numa explosão de música da orquestra, caiu o pano e a assistência dispersou-se, convencida de que há algumas mágicas, pelo menos, que não dependem da manga do mágico.

Stephen Leacock

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