«Uma Rosa na Campa de Homero»
Homero, Poeta Épico da Grécia Antiga
224- «UMA ROSA NA CAMPA DE HOMERO»
Em todas as canções do Oriente soa o amor do rouxinol pela
rosa. Nas noites calmas, claras de estrelas, o cantor alado faz uma serenata à
sua odorosa flor.
Não longe de Esmirna, sob os altos plátanos, para onde o
mercador puxa os camelos carregados que levantam orgulhosamente os pescoços
altos e pisam desajeitados a terra, que é santa, vi um roseiral florido. Pombas
bravas voavam entre os ramos altos das árvores e as suas asas cintilavam,
quando um raio de sol tombava sobre elas, como se fossem de madrepérola.
No roseiral havia uma flor entre todas a mais bonita e era
para esta que cantava o rouxinol as suas mágoas de amor. Mas a rosa estava
silente, nem uma gota de orvalho havia, como lágrima de compaixão, nas suas
pétalas. Curvava-se com o caule para baixo sobre umas pedras.
- Jaz aqui o maior cantor da terra! – disse a rosa. – Quero
perfumar a sua campa. Sobre ela quero derramar as minhas pétalas, quando a tempestade
as arrancar. O cantor da Ilíada tornou-se terra nesta terra, donde broto… Eu,
uma rosa da campa de Homero, sou demasiado sagrada para florir para o pobre
rouxinol!
E o rouxinol cantou até morrer.
O condutor de camelos chegou, com os seus camelos carregados
e os seus escravos negros. O filhinho dele encontrou o pássaro morto.
Enterrou-o na campa do grande Homero. E a rosa agitou-se ao vento. Veio a
noite, a rosa fechou completamente as pétalas e sonhou… que era um belo dia de
sol. Chegava uma multidão de estrangeiros, de francos. Faziam uma viagem de
peregrinação, à campa de Homero. Entre os estrangeiros havia um cantor do
Norte, da terra das neblinas e das auroras boreais. Arrancou a rosa, premiu-a
num livro e levou-a consigo para outra parte do mundo, para a sua pátria
distante. E a rosa murchou de pena e ficou no livro fechado, que ele abriu em
casa, dizendo:
- Eis uma rosa da campa de Homero!
Ora vejam, isto sonhou a flor que acordou e estremeceu ao
vento. Uma gota de orvalho caiu das suas pétalas na campa do cantor e o sol
ergueu-se, o dia tornou-se quente e a rosa resplandeceu ainda mais bela do que
antes – estava na sua Ásia quente. Ouviram-se então passos, vieram
estrangeiros, francos, que a rosa vira no seu sonho e entre os estrangeiros havia
um poeta do Norte. Este arrancou a rosa, premiu um beijo na sua boca fresca e
levou-a consigo para a terra de neblinas e auroras boreais.
Como uma múmia repousa agora o cadáver da flor na sua Ilíada
e como em sonho ouve ela abrir o livro a dizer: “Eis uma rosa da campa de
Homero!”.
Hans Christian Andersen
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