«Austerlitz», por W.G. Sebald.
«Austerlitz»
Romance de W.G Sebald
507- «AUSTERLITZ»
[Excerto/ pág. 32]
«Quando a chuva começou a fustigar as ruas, busquei refúgio
em um minúsculo bar chamado, se bem me lembro, Café des Espérances, onde para
considerável surpresa minha encontrei Austerlitz debruçado sobre seus
apontamentos em uma das mesinhas de fórmica.
Nesse primeiro reencontro, tal como em todas as ocasiões
seguintes, retomamos nossa conversa sem desperdiçar uma única palavra sobre a
improbabilidade de nosso reencontro em um local como aquele, que nenhuma pessoa
sensata teria procurado.
Do lugar onde ficamos sentados até tarde da noite no Café
des Espérances, era possível avistar lá em baixo, por uma janela que dava para
os fundos, um vale, talvez no passado cortado por campinas e regatos, no qual o
reflexo dos alto-fornos de uma gigantesca fundição chamejava contra o céu
escuro, e ainda me lembro claramente como Austerlitz, enquanto nós dois
mirávamos imóveis aquele espectáculo, deu início a um discurso de mais de duas
horas sobre como, no curso do século XIX, a visão de uma cidade operária ideal
nascida da cabeça de empresários filantrópicos se transformou inadvertidamente
na prática de acomodá-los em casernas, do mesmíssimo modo que nossos melhores
planos, disse Austerlitz, como me lembro , sempre se convertem no seu exacto
oposto quando postos em prática.»
W.G. Sebald
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