O poeta espanhol Vicente Pío Marcelino Cirilo Aleixandre y
Merlo, mais conhecido por Vicente Aleixandre, nasceu em Sevilha a 26 de Abril
de 1898. Grande expoente da poesia espanhola do séc. XX, foi um exemplo para os
poetas jovens da sua época. A sua primeira publicação literária aconteceu em
1928 com o livro «Âmbito». Em 1977 recebeu o «Prémio Nobel da Literatura».
Vicente Aleixandre faleceu em Madrid, a 13 de Dezembro de 1984.
Poet'anarquista
Vicente Aleixandre
Poeta Espanhol
SOBRE O POETA...
Apesar de ter estudado Direito em
Madrid, onde foi viver com a família aos 2 anos, foi à criação literária que
dedicou toda a sua vida. Publicou o seu primeiro livro aos 28 anos, «Âmbito,
com influências gongóricas.
No entanto, as suas primeiras
grandes obras são «Espadas Como Lábios» (1932) e «A Destruição ou o
Amor» (1934), nas quais o amor é apresentado como uma paixão dissolvente
que faz fronteira com a morte. A assimilação do surrealismo tornou-se patente
na prosa «Paixão da Terra» (1935).
Depois da Guerra Civil da Espanha
(1936-1939), resolveu sujeitar-se a um exílio interior, permanecendo na
Península Ibérica, o que o transformou numa referência para as gerações
poéticas do pós-guerra.
Em 1944 publicou «Sombra do
Paraíso», um sereno canto feito a um paraíso sem homem e sem história. No mesmo ano, quando foi eleito membro da Real Academia da Língua Espanhola, já trabalhava em« História
do Coração» (1954), título que marca uma reorientação de sua poesia em
direção ao «nós», impregnada de compreensão e solidariedade.
Cultivou esta tendência até 1968, quando, com «Poemas
da Consumação», retorna à lírica de profunda inspiração intimista e filosófica,
na qual reincidiu depois em «Diálogos do Conhecimento» (1974).
Em 1977 recebeu o Prêmio Nobel da
Literatura.
Fonte: UOL Lição de Casa
VIDA
Um pássaro de papel no peito
Diz que o tempo dos beijos não chegou;
Viver, viver, o sol invisível crepita,
Diz que o tempo dos beijos não chegou;
Viver, viver, o sol invisível crepita,
Beijos ou pássaros, tarde ou cedo ou nunca.
Para morrer basta um pequeno ruído,
O de outro coração ao calar-se,
Ou esse regaço alheio que na terra
É um barco dourado para os cabelos louros.
Cabeça dolorida, têmporas de ouro, sol que declina:
Aqui na sombra sonho com um rio,
Juncos de verde sangue que neste instante nasce,
Sonho apoiado em ti, calor ou vida.
É um barco dourado para os cabelos louros.
Cabeça dolorida, têmporas de ouro, sol que declina:
Aqui na sombra sonho com um rio,
Juncos de verde sangue que neste instante nasce,
Sonho apoiado em ti, calor ou vida.
Vicente Aleixandre
NO FUNDO DO POÇO
NO FUNDO DO POÇO
Além, no fundo do poço onde as pequenas flores,
onde as lindas margaridas não vacilam,
onde vento não há ou perfume de homem,
onde jamais o mar impõe sua ameaça,
ali, ali se esconde o silêncio,
qual rumor afogado por um punho.
Se uma abelha, se uma ave voadora,
se esse erro jamais previsto
se produz,
o frio permanece.
O sono vertical fundiu a terra
e já o mar é livre.
Talvez uma voz, ou mão, já solta,
um impulso para o alto aspire à luz,
à calma, à tibieza, a esse veneno
de um afago na boca que se afoga.
Porém dormir é tão sereno sempre!
Sobre o frio, sobre o gelo, sobre uma sombra na face,
sobre uma palavra hirta e, mais, já proferida,
sobre a mesma terra sempre virgem.
Uma tábua ao fundo, oh poço inúmero,
essa lisura ilustre a comprovar
que um corpo é contacto, frio seco,
sonho sempre, ainda que a fonte esteja cerrada.
Podem passar já nas nuvens. Ninguém o sabe.
Esse clamor... Existem as campânulas?
Recorda-me que a cor branca ou as formas,
recorda-me que os lábios, sim, até falavam.
Era o tempo cálido. - Luz, sacrifica-me!
Era então quando o súbito relâmpago
se detinha, suspenso, feito de ferro.
Tempo de suspiros ou entrega,
quando as aves nunca perdiam a plumagem.
Tempo de suavidade e permanência;
os galopes incontidos no peito,
cascos que não se detinham, revoltos.
As lágrimas rodavam como beijos.
E era sólida no ouvido a memória dos sons.
Assim a eternidade era o minuto.
O tempo, apenas imensa mão
suspensa entre os cabelos.
Oh sim, neste fundo silêncio ou umidade,
sob as sete capas do céu azul, eu ignoro
a música filtrada em gelo súbito,
a garganta que se precipita sobre os olhos,
a íntima onda que se aninha sobre os lábios.
Adormecido como uma tela,
sinto crescer a relva, o verde suave
que inutilmente aguarda curvar-se.
Um punho de aço sobre a relva,
um coração, um joguete esquecido,
uma clave, uma lima, um beijo, um vidro.
Uma flor de metal que assim impassível
sorve da terra o silêncio ou a memória.
Vicente Aleixandre
onde vento não há ou perfume de homem,
onde jamais o mar impõe sua ameaça,
ali, ali se esconde o silêncio,
qual rumor afogado por um punho.
Se uma abelha, se uma ave voadora,
se esse erro jamais previsto
se produz,
o frio permanece.
O sono vertical fundiu a terra
e já o mar é livre.
Talvez uma voz, ou mão, já solta,
um impulso para o alto aspire à luz,
à calma, à tibieza, a esse veneno
de um afago na boca que se afoga.
Porém dormir é tão sereno sempre!
Sobre o frio, sobre o gelo, sobre uma sombra na face,
sobre uma palavra hirta e, mais, já proferida,
sobre a mesma terra sempre virgem.
Uma tábua ao fundo, oh poço inúmero,
essa lisura ilustre a comprovar
que um corpo é contacto, frio seco,
sonho sempre, ainda que a fonte esteja cerrada.
Podem passar já nas nuvens. Ninguém o sabe.
Esse clamor... Existem as campânulas?
Recorda-me que a cor branca ou as formas,
recorda-me que os lábios, sim, até falavam.
Era o tempo cálido. - Luz, sacrifica-me!
Era então quando o súbito relâmpago
se detinha, suspenso, feito de ferro.
Tempo de suspiros ou entrega,
quando as aves nunca perdiam a plumagem.
Tempo de suavidade e permanência;
os galopes incontidos no peito,
cascos que não se detinham, revoltos.
As lágrimas rodavam como beijos.
E era sólida no ouvido a memória dos sons.
Assim a eternidade era o minuto.
O tempo, apenas imensa mão
suspensa entre os cabelos.
Oh sim, neste fundo silêncio ou umidade,
sob as sete capas do céu azul, eu ignoro
a música filtrada em gelo súbito,
a garganta que se precipita sobre os olhos,
a íntima onda que se aninha sobre os lábios.
Adormecido como uma tela,
sinto crescer a relva, o verde suave
que inutilmente aguarda curvar-se.
Um punho de aço sobre a relva,
um coração, um joguete esquecido,
uma clave, uma lima, um beijo, um vidro.
Uma flor de metal que assim impassível
sorve da terra o silêncio ou a memória.
Vicente Aleixandre
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